GEOPOLÍTICA DO BRASIL, TRAVASSOS, THEREZINHA E GOLBERY

 Sobre a Geopolítica do Brasil 

A disciplina geopolítica é parte da vivência acadêmica da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército desde a década de 1920, no início sob a influência do Professor e autor Backheuser. Foi uma necessidade do Exército Brasileiro em nortear-se frente às incessantes mudanças no contexto mundial das nações. Sem uma estratégia geopolítica qualquer preparação para o futuro torna-se débil.

Após os anos 1930, nota-se uma crescente participação dos analistas geopolíticos nos rumos que orientaram o desenvolvimento nacional. Destacou-se a figura do General Mário Travassos, eminente palestrante na ECEME por mais de vinte anos, imerso no contexto pós-revolucionário do governo de Getúlio Vargas.

Em um tempo em que a competição pela hegemonia sul-americana com a Argentina era mais franca, Travassos indicou o caminho a seguir, no sentido de dotar a política externa brasileira dentro de uma perspectiva internacional, tradicionalmente respeitadora para com a soberania das nações vizinhas. Nesse sentido, Travassos explicitou a necessidade de incrementar a influência brasileira em certas regiões do continente sul-americano, possibilitando ao Brasil promover meios, construir obras, não depender dos vizinhos no tocante à utilização de vias fluviais (pois assim o era na Bacia do Prata). O Brasil desenvolve políticas de integração e colaboração que superaram as desconfianças geopolíticas, apontando para um crescimento harmonioso de longo prazo.

Hoje há a perspectiva de serem traçados modais de transporte no sentido Leste-Oeste no território sul-americano, isso veio da visão de Travassos de "vertebração" do Brasil, de vértebra, ligação integrativa dos 12 países da América do Sul. Assim, a IIRSA (Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana) é fruto de sua compreensão da geopolítica da região sulamericana. Travassos foi o primeiro a conceber uma visão mais detalhada da estrutura sul-americana, expondo de forma clara as condições que influem na organização das infraestruturas da região. A delineação geopolítica de Travassos facilitou o estabelecimento de políticas onde se faz necessário partilhar recursos comuns. 

Um importante aspecto que tem origem na obra de Travassos foi a marcha brasileira em direção ao interior, fator que influenciou a própria ideia de Brasília. Com a criação do Plano de Viação Nacional, fortaleceu-se a política de dotar o país de uma rede viária possível, face ao grande desafio imposto pela geografia, pode-se ter uma ideia disso analisando o mapa do relevo brasileiro, em alto relevo mesmo, presente na Biblioteca da Academia Militar das Agulhas Negras, da qual Travassos foi comandante.

Ao tratar da cobiça em relação ao mundo amazônico, zona de fricção na região norte da América do Sul, Travassos chamou muito a atenção para a questão amazônica, o que passou a ser uma questão vital para o Exército Brasileiro. Uma série de planos e políticas, militares e civis, vieram ao encontro da necessidade de se desenvolver a Amazônia, a fim de sedimentar a soberania sobre seu imenso território.

De maneira similar, podemos atribuir à obra do general Golbery do Couto e Silva, aluno e contumaz palestrante da ECEME, algumas das mais sólidas iniciativas nacionais. Sua preocupação com a geopolítica nacional foi ainda mais ambiciosa que a do General Mário Travassos, tendo proposto a tentativa de se elevar o Brasil à condição de potência mundial.

Dessa forma, a política externa brasileira no Regime Militar, sobretudo até o governo do General Médici, tem caracteristicas que se coadunam com o pensamento de Golbery. No caso do governo do Marechal Castello Branco, observou-se uma submissão aos EUA, fruto da análise golberiana que inseriu o Brasil no, conceito da época, "sistema defensivo ocidental". Essa percepção está obsoleta com a queda da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas em 1990, contudo, volta e meia, volta à baila, em função de um certo neomacartismo e adesão automática aos interesses dos EUA, os quais, naturalmente, não são os nossos. A ideia de ver a Rússia e a China de modo hostil não coaduna com os BRICS e com o crescimento de um mundo multipolar. Mas quem será o Brasil no mundo multipolar?

Voltando a história, nos governos dos Presidentes Costa e Silva e Médici, e sobretudo Médici, foi possivel reconhecer a intenção de alçar o Brasil à situação de potência, ideia amplamente difundida por Golbery. Daí decorreu um natural afastamento político dos interesses dos EUA, vieram planos econômicos bem sucedidos, falou-se em "milagre econômico".

Outra iniciativa nacional que têm raízes profundas no pensamento golberiano é a marcha para o oeste, fator que propiciou a expansão da fronteira agrícola. A Golbery sempre incomodou o fato de o Brasil possuir uma fronteira oca, vazia, e sua política para o desenvolvimento nacional passou pela expansão da área de desenvolvimento do triângulo São Paulo-Belo Horizonte-Rio de Janeiro para o oeste, o que foi facilitado pela mudança da capital (falei sobre isso no vídeo de ontem). As políticas públicas adotadas pelos governos militares com relação à ocupação econômica do centro-oeste e da Amazônia meridional (sul) se apoiaram em parte na visão de Golbery, de se proceder ao desenvolvimento nacional através da construção de um "arco de desenvolvimento". Seus reflexos podem ser vistos hoje na gigantesca produção agropecuária do centro-oeste brasileiro.

Outros reflexos dessas políticas são a implementação da Zona Franca de Manaus, que aumentou a capacidade econômica e povoou o Estado do Amazonas, a instalação de inúmeros Pelotões Especiais de Fronteira nas longínquas fronteiras amazônicas, e a construção de obras rodoviárias e ferroviárias. Da mesma forma, os projetos de extração mineral, como o Projeto Carajás, são advindos da mentalidade golberiana de se sedimentar a soberania sobre a Amazônia através de seu desenvolvimento econômico.

Por fim, podemos atribuir à professora Therezinha de Castro o mérito de ter exposto a necessidade de se resguardar os direitos nacionais com relação à Amazônia e com relação a seu entorno estratégico, sobretudo no tocante aos Andes e ao Atlântico Sul.

Quanto à Amazônia, a eminente professora e palestrante da ECEME afirma, a soberania só estará assegurada através de um sólido projeto de preservação e de desenvolvimento da Amazônia. Dessa forma, o Projeto Calha Norte, mesmo não sendo diretamente decorrente de seus estudos, é hoje fortemente influenciado por seu legado, pois possibilita a assistência ao homem "amazônida" no local onde ele deve ser fixado, que á a floresta. Dessa fixação do homem à floresta e do desenvolvimento regional decorreria a soberania.

Quanto à questão do Oceano Atlântico Sul, os estudos da professora reforçaram a urgência de se formar a ZOPACAS (Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul, promove a cooperação regional e a manutenção da paz e segurança na região do Atlântico Sul), cujo fomento hoje é necessário para reduzir a influência de potências estrangeiras na região. Ressalta-se a política de aquisições de terra pela China na África Ocidental e a crescente movimentação de marinhas estrangeiras nas águas do Atlântico Sul, como se vê, nesta mesma semana, os exercícios comemorativos com a presença do porta-aviões norte-americano. 

Percebe-se ainda a influência de Therezinha de Castro nas iniciativas brasileiras com relação às questões antárticas. Desde a década de 1950, a pesquisadora procurou reforçar a importância para o Brasil de investir na manutenção de uma posição política contrária à ocupação econômica do continente gelado, com clara inclinação para sua distribuição (em termos geográficos) entre os países do hemisfério sul da Terra. Assim, a professora contribuiu diretamente com a construção da EACF de forma a garantir os direitos brasileiros na região. A EACF é a Estação Antártica Comandante Ferraz está localizada na Península Keller, Antártida, ocupando uma área de 4.5 km², pode abrigar 64 pessoas. A estrutura contém heliponto, auditório, alojamentos, laboratórios, depósitos, oficinas, biblioteca, salas de lazer e estar, enfermaria, sala de comunicações, ginásio de esportes, cozinha e refeitório. 





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