QUEM É O REI DO TRÁFICO

 Jesus Tovar , canal YouTube 

Há alguns dias, o presidente Andrés Manuel López Obrador, do México, fez uma declaração que passou despercebida pela grande mídia, ele disse que a fronteira entre as autoridades e o crime é rompida pelos tipos de colarinho branco, que saqueiam o México há muitos anos. López Obrador diz que é essencial existir uma linha divisória clara entre a autoridade estatal e o crime organizado, uma vez que o crime de colarinho branco é muito maior do que o crime dos cartéis mexicanos, subordinados daquele.

Vamos entrar nesse assunto, veja, por exemplo, um chamado rei do tráfico, Joaquín El Chapo Guzmán. El Chapo alcançou, talvez, o nível de um Genaro García Luna, o nível dos grandes capos do verdadeiro crime organizado. Verdade? Falso. El Chapo não joga nas grandes ligas, não entra nos grandes campos de golfe. Os homens mais ricos e influentes do narcotráfico sequer são hispânicos, são os de colarinho branco, imaculado.


Anteontem, Donald Trump disse, sempre o diz em seus comícios, que o tráfico de drogas pode "derrubar o governo mexicano em dois minutos". O seu vice-presidente, o sionista JD Vance diz, literalmente, que é preciso invadir e bombardear o México, para poder se ver livre dos cartéis. É jogo, é desinformação. Veja, uma frase muito boa, de antigos jornalistas norte-americanos, quando havia jornalismo nos EUA, é a de que se o governo norte-americano quisesse realmente acabar com os cartéis, se decidisse isso às 8 da manhã, às 3 horas da tarde, os cartéis estariam acabados. Isso é verdade, mas então por que nunca quiseram realmente acabar com os cartéis?

Vamos analisar aqui um pouco e colocar uma luz neste assunto. Os Estados Unidos não acabam com os cartéis porque ele mesmo é o cartel dos cartéis, o capo dos capos de tutti los capos.  

A história não mente embora muitos mentem na história. A grande rede de crime organizado, de tráfico de armas e drogas nos EUA, começou ou cresceu tremendamente na década de 1920. O alcoolismo se tornou um problema sério para a classe trabalhadora norte-americana, sufocada pelo fascismo patronal, numa época de enorme especulação financeira e difíceis condições de vida para o chão de fábrica. Ao mesmo tempo, o consumo acelerado de ópio crescia vertiginosamente nas classes dominantes. Isso se tornou preocupante. Como medida para enfrentar o vício e a convulsão social, o governo decretou a lei seca. Essa proibição foi a grande causa e a melhor aliada para o surgimento de máfias bilionárias. A ilegalidade é grande aliada dos negócios do crime organizado. Este ponto é fundamental para se entender o problema. O punitivismo, a cultura da punição, tão glorificada nos Estados Unidos, na realidade, é uma ferramenta das máfias para se consolidarem nas grandes cidades. O punitivismo parte das próprias autoridades. Veja, por exemplo, o ópio quando penetrou na China, forçada pelo império britânico, o álcool escocês e canadense introduzido pelas máfias britânicas e norte-americanas, e toda uma rede de negócios legais e ilegais gerou cassinos, prostituição, bares, restaurantes, boites, dancings, casas de show, clubes esportivos etc, tudo isso decorreu da natureza do negócio central, foi uma consequência e um suporte para a grande lavagem de dinheiro. A lavagem de dinheiro é o principal negócio, o grande protagonista, a essência do crime organizado. 

Obviamente, as máfias corromperam completamente as instituições norte-americanas, estão envolvidos até o osso em campanhas eleitorais, as máfias cresceram junto com as próprias instituições e obtiveram um sem-número de privilégios e exceções. Até mesmo as organizações sindicais, de defesa dos trabalhadores, foram corrompidas, elas acabam operando contra os movimentos populares, através de agentes policiais comprados, de forças parapoliciais e paramilitares, e cujos chefes são, SEMPRE, os políticos. os colarinhos brancos. 

E aí vem o ponto chave da história: a crise de 1929. A crise de 29 ignificou uma mudança na política norte-americana em relação às drogas, foi necessário aumentar as receitas através de impostos, e a pressão para abrir o negócio e o comércio do álcool falou mais forte. Os líderes dos EUA entenderam, inclusive, que era um.negocio internacional, e que deveriam pegar um quinhão do enorme comércio das drogas britânico, o qual veio do século XIX, na China. Daí o governo Roosevelt suspende a lei seca, e as máfias já estão instaladas no poder. A política econômica keynesiana, do Mainard Keynes, especialmente no pós-guerra, depois de 1945, massificaram o álcool e a indústria farmacêutica. Cresceu enormemente o remédio tarja preta, a indústria psiquiátrica dos Estados Unidos se tornou gigante. Ao mesmo tempo, com o objetivo de combater as organizações rurais de camponeses, de muitos imigrantes, nas áreas rurais, o império yankee ataca as formas tradicionais de cultivo da coca e passa a controlar o seu comércio. 

Apos a sensacional vitória revolucionária de Fidel Castro, em Cuba, veja, Fidel expulsa todos os gângsters norte-americanos e seus cassinos e casas de prostituição e bebidas da ilha. Fidel afugenta os donos das casas de shows e cassinos da ilha, e essa foi a verdadeira inimizade entre os EUA e Fidel, não foi por causa da aproximação com a União Soviética, não foi por causa de ideologias, foi por causa de dinheiro, de negócios, de lucros. Fidel, num primeiro momento, baniu o negócio da droga e o branqueamento de capitais em Cuba. 

Então, entendendo a coisa para o campo da ideologia, podemos dizer sem erro, que o neoliberalismo é a base de tudo, é a causa do narco-capitalismo, melhor dizer do narco-imperialismo, e com consequências desastrosas para muitas comunidades e classes de pessoas. Então, retomando.o fio da meads, os EUA vinham da crise da Guerra do Vietnã, e houve uma grande ascensão de movimentos sociais na década de 60. Neste contexto, Nixon declara que o grupo Pantera Negra era o "Inimigo Público Número Um" do FBI. Um grupo que protestava a favor de Direitos Civis era o inimigo público número um. O que o FBI fez? Moveu seus pauzinhos e muito por acaso as drogas começaram a assolar nos bairros afro-americanos, os bairros latinos, as periferias. E o crack começou a se espalhar nesses bairros, certamente de mãos dadas com narcotraficantes cooptados pela CIA. Aliás, foi lá na década de 60 que Timothy Leary usava LSD nas suas aulas na Universidade da Califórnia, o LSD nunca faltava nos grandes festivais de Woodstock, Monterrey, da ilha de Wight etc. E a droga criou os bodes expiatórios, os culpados, os delinquentes. O combate às drogas foi um elemento de repressão e de destruição de autênticos movimentos populares, minavam mesmo os movimentos, os ativismos e a organização popular, acabou mesmo com os Panteras Negras. A epidemia de crack nada mais era do que uma epidemia patrocinada pela CIA, pelo FBI, e pelo próprio governo norte-americano, direcionada aos setores populares, sobretudo latinos e afro-americanos. Isso foi crescendo. 

Entre 1984 e 1994, a taxa de homicídios entre homens afro-americanos duplicou, fortalecendo o racismo. As prisão americanas estão abarrotadas de afrodescendentes, hispânicos e descendentes de nativos. A criminalização se tornou um grande negócio, um grande mercado do negócio prisional, prisão é uma ramificação importante do crime organizado, pertence às autoridades do Estado Judiciário. É um grande celeiro para explorar prisioneiros, sujeitos a trabalhos forçados, são arregimentados pelos cartéis. O sistema prisional americano é um grande negócio, sobretudo, é um negócio altamente lucrativo e necessário no sistema financeiro e bancário atual. 

Seguindo.

Parte dos esforços das autoridades, no período da Guerra Fria, girou em torno da chamada contra-revolução mundial, "combater o comunismo". Daí que o negócio das drogas virou uma verdadeira globalização das redes de tráfico de drogas, dirigido pelos Estados Unidos. No Afeganistão, a coisa foi mais ou menos assim, lá por 1978, sob uma campanha focada em saúde pública, o Partido Democrático Popular do Afeganistão, marxista, derruba um partido-fantoche do governo americano, isso foi um duro golpe para a administração dos EUA. Porque o Afeganistão representava um ponto estratégico para aproveitar os excelentes recursos energéticos da região, além de garantir o controle dos oleodutos que saem do Mar Cáspio. Para enfrentar esta situação, a CIA fomentou e treinou, com os serviços de inteligência do Paquistão e da Arábia Saudita, grupos extremistas. E começaram os ataques terroristas no Afeganistão. O governo afegão, desesperado, pediu ajuda à URSS. Estados Unidos Grã-Bretanha e Arábia Saudita criam então a irmandade muçulmana, sob agentes da CIA, do MI-6, da Arábia Saudita, através do grupo bancário Laden. Osama Bin Laden administrou um grupo, ele era um agente da CIA, posteriormente foi usado como bode expiatório e falsamente acusado de "ter derrubado as Torres Gêmeas".

O pai de Osama, famoso banqueiro, era estreitamente ligado à família Bush, sócios da empresa petrolífera Energy. A família Bush é uma família do petróleo, o patriarca Prescott Bush foi um dos que investiram no partido nazista, lá na década de 20 e 30. Nos anos 70 e 80, George Bush, que foi diretor da CIA, naqueles anos, era vice-presidente dos Estados Unidos, então vc tinha uma ligação da família Bush, o clã Bin Laden, e o Banco de Crédito, no grande negócio do petróleo, e investiam no branqueamento de capitais, no tráfico de armas e drogas. Muitas operações secretas da CIA surgiram nesta época, dos petrodólares, em várias partes do mundo. Em finais dos anos 70, a produção de heroína no Afeganistão ainda era mínima, mas após a intervenção norte-americana o negócio agigantou, expandiu-se para o Paquistão, usando o Banco de Crédito para lavar o dinheiro, fornecer a logística e a proteção das rotas do tráfico para o Sudeste Asiático (Oriente Medio) e de lá para os Estados Unidos. Os Estados Unidos financiaram a insurgência afegã e os contras da Nicarágua. De forma semelhante, a CIA participou do contrabando de ópio da China e da Birmânia para a Tailândia. Na luta contra o governo chinês e paquistanês, a AlQaeda trabalhou para a CIA, recrutava combatentes e controlava rotas. As ligações da CIA se deram em várias frentes, como por exemplo, na guerra da Bósnia, Kosovo e Macedônia, quando a Iugoslávia foi esfacelada. A quebra da unidade nacional é vital para facilitar as rotas do tráfico de drogas, uma vez que não há um poder estatal coeso que vai dificultar o tráfico. Extremistas islâmicos eram recrutados em vários países do Médio Oriente, Ásia Central, Chechénia e Sudeste Asiático. Grande parte do financiamento destas organizações vinha diretamente do tráfico de drogas, sobretudo através da rota Afeganistão-Paquistão passando pela Albânia e Kosovo, e daí vai terminar na Europa e América. Outro exemplo de como o tráfico bancou golpes de estado e derrubada de governos se deu no Irã, na época do xá Reza Pahlevi. A CIA precisa de fundos ilícitos para derrubar regimes e colocar seus agentes nos postos-chaves. No caso do Cartel de Medellín e o grupo de Guadalajara, a CIA controlou Pablo Escobar, Gonzalo Rodríguez Gacha, Rafael Caro Quintero, Miguel Ángel Félix Gallardo e Juan Vallesteros, que por sinal estão todos mortos ou detidos. Estabelecendo bases em Yucatán e rotas para a entrada de cocaína nos Estados Unidos, dando apoio financeiro aos contras na Nicarágua, patrocinando e lavando dinheiro para colombianos e mexicanos, a violência cresceu de mãos dadas com a CIA, de mãos dadas com os Estados Unidos, e tudo isso se deu quando a Justiça americana acusava o governo sandinista de estar envolvido no tráfico de drogas e armas. A rede de drogas contou com um auxiliar de peso no Panamá, o general panamenho Manuel Noriega, agente da CIA, amigo pessoal de George Bush, e que coordenava as operações no Panamá, até que num belo dia os sandinistas derrubaram um avião tripulado por um agente da CIA. Isso expôs as ligações de Noriega com o narcotráfico. Os EUA então deram as costas ao seu aliado, e o DEA acusa Noriega de ser traficante de drogas, invadem o Panamá, capturam Noriega, milhares de panamenhos são mortos.

As transformações do Estado e o cenário de guerra no México decorre de um fato inevitável: a guerra e a militarização da vida pública avançam juntamente com reformas neoliberais, o que começou fortemente na década de 1980, com Reagan, e isso continua seu curso, até hoje. Junto à obscena neoliberalização dos costumes e dos negócios, advém a desnacionalização da economia e a militarização dos Estados. O poder militar nesta era neoliberal criou as condições para uma nova hegemonia, a guerra e a globalização são processos inseparáveis. Vamos entender, a guerra contra o tráfico de drogas não é na verdade uma guerra contra o tráfico de drogas, a guerra responde a uma outra agenda, diametralmente oposta aos objectivos declarados pelas autoridades, o resultado mais tangível da falsa "guerra às drogas" é a emergência do narco-estado, do Estado facilitador da empresa criminosa, o Estado é um protagonista da maquinação criminosa e não uma vítima do crime organizado. A história coloca o tráfico de drogas como o germe da guerra, isso é um mito inventado, uma distorção da realidade. Desde o início do século XXI há um consenso de que o dinheiro do tráfico de droga é lavado pelos bancos norte-americanos e ingleses, HSBC e Citybank, dezenas de bilhões de dólares. O financiamento do narcotráfico provê os sindicatos da máfia dos corsos na França desde a década de 50, o Triângulo do Ópio proveu os soldados de Chiang Kai Chek na China (ver o vídeo do canal....), estendeu-se à Austrália, Panamá, Colômbia, América Central ,Afeganistão, com o objetivo de controlar áreas cada vez maiores do negócio das drogas, transformado hoje numa estrutura financeira extremamente complexa, que liga organicamente os seus bancos e a sua elite política ao sistema econômico dos EUA. As autoridades dos EUA preferem esquecer que a solução para os seus problemas econômicos geram situações de de dependência, de extrema desesperança, da perda de horizontes na vida, da ruptura do tecido social, da crise moral que leva milhões de cidadãos a soçobrar, a cair no uso nocivo de narcóticos. Obviamente, a causa direta não é dos cartéis mexicanos, mas sim de poderosos políticos democratas e republicanos, mais ainda, de forças acima dos políticos, no chamado deep state. Washington é quem instrumentaliza a terrível crise de abuso humano que atualmente assola a sociedade americana. E boa parte desse extremismo financeirista é para atingir a China, o seu maior rival económico e geopolítico. Ao mesmo tempo sufoca e coibe o processo de desenvolvimento da América Latina. Via de regra, o modelo criminoso mantido em segredo por Washington tenta desestabilizar o governo mexicano. Então quando Trump ou qualquer outro cria narrativas sobre o combate ao tráfico de drogas e culpa o governo mexicano, o que está por trás é a omissão de sua própria responsabilidade ou melhor dizer, sua irresponsabilidade




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