Ele é um cão
Robert De Niro, renomado ator e figura icônica da cultura americana, expressou sua indignação em relação a Donald Trump com palavras contundentes: “Ele é um punk, um cachorro, um porco, um charlatão, um idiota que não sabe o que diz, que não faz sua lição de casa, que não se importa, que pensa estar brincando com a sociedade, que não paga seus impostos. Colin Powell disse o melhor: ele é um desastre nacional, uma vergonha para este país”. De Niro lamenta que os Estados Unidos tenham chegado ao ponto de permitir que alguém como Trump, descrito por ele como um “idiota” e “bozo”, alcance tal proeminência. Em tom de revolta, o ator chegou a afirmar que gostaria de “dar um soco no rosto” de Trump, em resposta às declarações beligerantes do político.
O historiador Leandro Karnal, em seu livro sobre a história dos Estados Unidos, destaca as incoerências e paradoxos da nação, mas enfatiza que a democracia americana sempre se sustentou em pilares inquestionáveis, que agora estão sendo sistematicamente desafiados por Trump. Um desses pilares é a autonomia dos estados, historicamente protegida. A Guarda Nacional, por exemplo, jamais deveria ser mobilizada sem a autorização do governador de cada estado. Além disso, o princípio de que o exército americano não pode atuar em território nacional, herança das tradições romanas que proibiam legiões de entrar em Roma, está sendo violado. Trump, segundo críticos, ignora essas normas, desafiando a autonomia dos estados e centralizando o poder de maneira perigosa.
Trump também é acusado de atacar a independência das universidades, promovendo a expulsão de estudantes, cientistas e professores, e de criminalizar críticas ao governo, processando emissoras de televisão e jornais. Essas ações são vistas como um ataque direto aos fundamentos da democracia americana. Karnal compara a situação atual ao momento histórico em que Júlio César cruzou o Rubicão, trazendo suas legiões para Roma e desafiando a república. Metaforicamente, Trump teria “cruzado o Rubicão”, instalando um precedente perigoso para a democracia.
No entanto, Trump não é um fenômeno isolado. Ele não surgiu do nada, mas é produto de uma construção histórica dentro da sociedade americana. O sociólogo Max Weber, ao visitar os Estados Unidos, já apontava sinais de decadência moral, com a perda da base calvinista que moldou os valores fundacionais do país, especialmente no Norte e Nordeste. A escravidão, intensificada após a independência, foi um elemento central na degradação desses valores. Diferentemente da escravidão da antiguidade, que era resultado de guerras, a escravidão moderna nos EUA foi fundamentada em critérios raciais, apoiada por teorias supremacistas brancas que justificavam a subjugação.
A degradação moral da política americana tornou-se mais evidente a partir do governo de Bill Clinton, que, segundo analistas, começou a erodir pilares institucionais, mesmo que de forma menos explícita. Hoje, a ascensão de Trump reflete um movimento mais amplo, apoiado por setores que buscam substituir a globalização por um novo nacionalismo. Esse movimento enxerga um confronto entre os Estados Unidos e a China por recursos, influência política e domínio global, o que pode culminar em conflitos militares.
O cientista político Steven Levitsky argumenta que a apatia de parte do povo americano diante dessas mudanças se deve à ausência de uma experiência histórica com golpes ou ditaduras, ao contrário do Brasil, que enfrentou sucessivos episódios autoritários e desenvolveu mecanismos de resistência. Nos EUA, a falta de familiaridade com tais crises deixa a sociedade e o Congresso aparentemente “anestesiados”. O ator Wagner Moura, por exemplo, foi criticado por políticos brasileiros após apontar que os americanos invejam o Brasil por sua capacidade de processar e punir golpistas, algo que os EUA não conseguiram fazer. A Suprema Corte americana, ao anular processos contra Trump e reforçar sua imunidade presidencial, parece incapaz de conter esses avanços autocráticos.
Além disso, Trump tem desafiado normas internacionais, como a restrição de vistos para líderes que participariam da abertura dos trabalhos da ONU. A sede das Nações Unidas, localizada em Nova York, é considerada território neutro, e tais ações são vistas como uma afronta à comunidade internacional. Há quem defenda que a ONU deveria ser transferida para cidades como Bruxelas ou Genebra, como resposta a essas provocações.
A questão econômica também é central. Os Estados Unidos enfrentam uma dívida pública superior a 36 trilhões de dólares, maior que seu PIB, estimado em cerca de 30 trilhões. O gasto militar, próximo a um trilhão de dólares anuais, é insustentável. Guerras, como a do Golfo e a do Afeganistão, só foram possíveis com financiamento externo, como de Japão e Arábia Saudita. A retirada das tropas americanas do Afeganistão, após 20 anos de ocupação, foi motivada por falta de recursos, não por uma decisão pacifista. Atualmente, equipamentos militares obsoletos estão sendo enviados à Ucrânia, enquanto os EUA evitam comprometer tecnologia de ponta.
No Brasil, declarações como as do deputado Eduardo Bolsonaro, sugerindo que caças americanos poderiam invadir o país, são vistas como absurdas e desinformadas. A capacidade militar dos EUA é inegável, mas a ocupação de territórios, como demonstrado no Vietnã e no Afeganistão, é extremamente complexa e custosa. A retórica belicista de Trump, portanto, é vista como um rugido de um “leão sem dentes”, incapaz de sustentar aventuras militares de grande escala.
Por fim, a ascensão de Trump reflete um movimento maior, apoiado por setores financeiros e armamentistas que buscam consolidar uma autocracia nos EUA. Esse processo, no entanto, não termina com ele. Grupos que defendem essa visão continuarão a atuar, independentemente do fim de seu mandato. A democracia americana, apesar de seu federalismo robusto, enfrenta desafios estruturais que vão além de um único líder, exigindo uma reflexão profunda sobre os rumos da nação.
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