Virar à direita, virar à esquerda! ...

Há muito preconceito e opiniões pejorativas em torno de certos assuntos, sobretudo quando se trata de conceituar esquerda e direita. Os políticos fazem o que querem das ideias dos pensadores, para seus próprios fins, para infelicidade ou felicidade dos rebanhos. Então os fanatismos, os fundamentalismos, os pastiches ideológicos moldam e usam um emaranhado de ideias dos grandes pensadores. Estas ideias também mudam ao longo de suas trajetórias. Se a gente lesse as grandes obras, já seria uma grande coisa (as obras que influenciaram a história). Já seria uma grande coisa ler O Príncipe, O Leviatã, A Riqueza das Nações, O Contrato Social, Manifesto Comunista etc. Quanto a conhecer os meandros, as profundidades do pensamento de um autor ou autores é um trabalho hercúleo, que cabe ao especialista. Em geral, sou contrário a ler comentadores, intérpretes, escolas, seguidores etc, antes de conhecer o original. Marx pode ser bem entendido a partir do Capital e do Manifesto Comunista. Sua obra é vasta e sua influência sobre Lênin e Stálin pode ser compreendida a partir destes dois livros. Aprendi que Marx e Engels (sem entrar em suas diferenças ou seus precursores) consideraram o comunismo como o último estágio da evolução social e resultado da vitória final das lutas do proletariado em busca de uma sociedade sem classes, sem propriedades privadas sobre os meios de produção. O comunismo seria, portanto, a sociedade social e econômica igualitária, para todos. Os bens seriam produzidos em abundância (daí a necessidade de se ter passado antes pelo capitalismo). As forças produtivas seriam plenas (‘dê a cada um segundo sua capacidade, a cada um segundo sua necessidade’). Portanto, seria a evolução e superação do capitalismo, base e premissa para o comunismo. Mas a filosofia de Marx é de segunda mão. Seus abomináveis resultados práticos estão sujeitos, não a más interpretações e distorções, mas à própria qualidade filosófica de seu pensamento. Não entro nesta seara de ser Marx inferior a Hegel, ou que tenha invertido as ideias do materialismo histórico e dialético. Conhecedores, afirmam, ser Kant, um exemplo muito superior. A história, não ideologizada, mas factual e embasada em documentos e observações idôneas, tem como certo o fato de que a 'ditadura do proletariado' NÃO OCORREU JAMAIS na URSS do século XX ou em parte alguma. Ditadura, em verdade, 'sobre', e não 'do' proletariado, terrível opressão sobre dezenas de povos. Com os expurgos, o Gulag, as execuções sistemáticas da oposição política (além de intelectuais, artistas, capitalistas, latifundiários, religiosos etc), a censura oficial, a coletivização forçada nos campos e fazendas etc. A industrialização e o capitalismo de estado foi feito. Creio que ali só poderia mesmo ser feita pela ditadura totalitária de esquerda, naquele meio feudal, agrário, rural, ancestral. É interessante que, na evolução do capitalismo nos EUA, nunca houve, significativamente, o problema da luta de classes, tal como preconizada por Marx, Lênin, Stálin etc. Desde seu começo, os EUA, capitalismo vitorioso e motor econômico, viram-se como nação, possibilitando benefício razoável e boa participação para a maior parte de sua população (tirando a marginalização dos negros e a questão racial, a luta pelos direitos civis e outros fenômenos pertencentes ao sec. XX). Aprendi história a partir da resultante, do tronco principal, em grandes linhas, pragmaticamente, em função de seus resultados e tendências principais. O Marx que Stalin 'pôs em prática' na URSS foi o da ditadura do partido, capitalismo feito na marra para o benefício da casta política e o seu oligopólio policial. O povo domado, sobreviveu, perdeu seres queridos, resignou-se à ‘igualdade’ forçada. Não é de se admirar que a Rússia seja, hoje, um país dominado por poderosas máfias e milícias particulares, em torno das grandes empresas e dos grandes negócios, todos abaixo do KGB, onipotente. Sobre a URSS comunista, propagou-se o conceito de comunismo num sentido pejorativo, negativo, sinônimo de bolchevismo, de marxismo-leninismo, ateu, degradante, desinformante. O Estado detém a totalidade das indústrias, comércio, meios de transporte, bancos, e controla tudo através de um partido político. A vida social, cultural, econômica, artística e criativa de todos os cidadãos e habitantes é controlada e regida pelo partido, tornado Estado. Há que se trazer à discussão o fato de que a ideia de comunismo é muito antiga. No sentido antropológico designa a condição primitiva do homem da pedra. Os índios americanos viviam, em parte, em estado de comunismo (há um senso de coletividade tribal e o produto do trabalho é dividido de acordo com certas funções e privilégios). No cristianismo primitivo, os bens são partilhados segundo as necessidades de cada um. Os objetivos, porém, nas igrejas cristãs primitivas e ordens monásticas derivadas, são espirituais, religiosos, contemplativos, liberativos. A coletivização, praticada sob regras estritas, estreitas, rígidas, é um modo de organização básica, a serviço da mais intensa vida de devoção e de oração. O 'comunismo' no cristianismo está a serviço da vida espiritual, portanto o objetivo é, sempre, espiritual. O chamado comunismo clássico (conceito de 1858, época das ‘primaveras dos povos’) designa a destruição da ordem capitalista através de coerção violenta, daí o chamado comunismo revolucionário, instalado após a revolução russa e em luta permanente (revolução permanente) contra os capitalistas, os latifundiários e seus defensores (militares, religiosos, políticos, intelectuais, reacionários etc).
Bom, a ideia de esquerda vem da Revolução Francesa. A bancada de representantes populares (jacobinos) sentavam-se à esquerda do plenário da assembléia. Nos EUA, até hoje, por tradição, os democratas sentam-se à esquerda e os republicanos sentam-se à direita do presidente do congresso. Pode-se dizer, didaticamente, que os comunistas são esquerdistas e creem na superioridade dos regimes socialistas e comunistas. Combatem o capitalismo enquanto regulador do mercado. Afirmam que o Estado tem o dever de intervir na economia a fim de prover o bem-estar social e eliminar as desigualdades do capitalismo. Veja, que em assim sendo, os esquerdistas de hoje em dia são taxados de conservadores por seus críticos liberais. O  progressismo ideológico, a superioridade 'moral' dos comunistas (preocupa-se, em termos de discurso, com os oprimidos e explorados) partiria da descrença na capacidade do ser humano ‘cuidar de si mesmo’, de ser livre, liberal, agente de suas próprias capacidades; outorgando as incapacidades ao controle do Estado. Já o conceito político de direita antecede a Revolução Francesa. A nobreza palaciana posicionava-se à direita do rei nas reuniões dos Estados-Gerais (França). Durante a Revolução os nobres (nobreza, clero e parte dos girondinos) sentavam-se à direita na Assembleia. Associa-se, portanto, o termo ‘direita’ com a política conservadora, de manutenção dos privilégios e status quo. Como os membros do Parlamento francês (em 1793) se sentavam à direita (dentro do recinto) eram , via de regra, contrários a qualquer medida ou posição ideológica contrária à situação, ao status quo, aos privilégios de classe da nobreza, clero etc. Serão taxados de reacionários, pois ‘reagem’, sistematicamente, às propostas igualitárias dos situados à esquerda. O termo ‘direita’, assim, está associado àquela ideologia contrária às transformações sociais, à igualdade político-social-econômica dos cidadãos. Defende governos autoritários (a esquerda também defende) para impedir a organização e a pressão das classes populares, organizadas por agentes profissionais. Por isso, ‘direita’ são os partidos de direita. A extrema direita, na definição ideológica clássica (criada pela esquerda), defende o capitalismo e os privilégios das elites abastadas, freqüentemente de modo racista (como no exemplo ‘perfeito’, o nazismo), chauvinista e fascista (a força do líder e a submissão da massa). Para finalizar é bom conceituar 'capital'. O termo 'caput' significa cabeça e 'capital' como todos sabem, é sinônimo de dinheiro. Do ponto de vista do marxismo, o capital constante é a parte do capital total que não gera a mais-valia, apenas transfere o seu valor para as mercadorias, matérias-primas, equipamentos etc (parte do capital ativo fixo não circula diretamente às pessoas mas encontra-se investido na forma de instalações, máquinas,  equipamentos etc). O capital, na conceituação clássica, está nas mãos da empresa privada, individual, e é trocado pela mão-de-obra, na forma de salário. Com relação à mais-valia, Marx afirma que ela existe quando o operário vai ao mercado e compra um sofá que ele mesmo fabricou, por exemplo, e paga  valor maior do que aquele que recebeu pela sua mão-de-obra para produzi-lo. A mais-valia é o lucro do empresário, do burguês, do dono dos meios de produção. Aquele que bancou, investiu na engenharia, na construção das máquinas e dos equipamentos industriais. Finalmente, para melhor definirmos termos chaves, o capitalismo pode ser definido como sistema econômico baseado na legitimidade da posse e do uso de bens privados, adquiridos através de investimentos e retornos financeiros. Advoga a liberdade de comércio e de indústrias, com o objetivo de adquirir lucros para si e para a ampliação constante daqueles bens. O liberalismo prega a não-intervenção do Estado na atividade econômica. O 'neo-liberalismo' crê, em seu ideário, que a ampliação da atividade privada trará a necessária ampliação do mercado de trabalho e no final todos serão beneficiados. Já o Capitalismo de Estado é o envolvimento ou intervenção do Estado (governo) diretamente nos setores produtivos e de serviços (através de estatais, de parcerias do tipo concessão, permissão, ou empresas mistas etc). Conceitos assim determinados como slogans NUNCA descrevem adequadamente a realidade. 

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