Brzezinski

 

**A Relevância de *O Grande Tabuleiro Mundial* de Zbigniew Brzezinski na Geopolítica Contemporânea**

Zbigniew Brzezinski, renomado politólogo e estrategista geopolítico de origem polonesa naturalizado estadunidense, é uma referência central para compreender a política externa dos Estados Unidos no período pós-Guerra Fria. Nascido em Varsóvia, emigrou para o Canadá após a invasão da Polônia em 1939, formou-se na Universidade McGill e obteve doutorado em Harvard, onde iniciou sua carreira acadêmica antes de lecionar em Columbia e Johns Hopkins. Como conselheiro de segurança nacional do presidente Jimmy Carter (1977-1981), Brzezinski desempenhou papel decisivo na normalização das relações com a China, nos Acordos de Camp David e no apoio aos mujahidin afegãos contra a ocupação soviética.


Sua obra seminal, *O Grande Tabuleiro Mundial* (1997), publicada poucos anos após o colapso da União Soviética, oferece uma análise estratégica para a manutenção da supremacia global dos EUA em um mundo unipolar. Combinando geopolítica, história, relações internacionais e economia, Brzezinski propõe que a Eurásia, o "grande tabuleiro" geopolítico, é o cenário determinante para a ordem internacional do século XXI. Sua visão permanece surpreendentemente atual para interpretar os conflitos e dinâmicas globais contemporâneos.


### O Tabuleiro Euroasiático e os Jogadores Estratégicos


No livro, Brzezinski identifica os "grandes jogadores geoestratégicos" — Estados Unidos, China, Rússia, Alemanha, França e Índia — e os "pivôs geopolíticos", estados cuja relevância deriva de sua localização estratégica, como Ucrânia, Azerbaijão, Irã, Coreia do Sul e Turquia. Em 1997, incluir China e Índia como potências emergentes era uma projeção ousada, considerando a fragilidade econômica da Rússia e o peso ainda limitado da Índia. Hoje, com a China como potência global e a Índia como a quinta maior economia, a previsão de Brzezinski se confirma.


Os pivôs geopolíticos, segundo o autor, são territórios cuja influência ou controle pode alterar o equilíbrio de poder regional ou global. A Ucrânia, por exemplo, é descrita como essencial para conter a Rússia. Brzezinski argumenta que, sem o controle da Ucrânia, a Rússia perde sua capacidade de ser um império euroasiático. A independência ucraniana, com seus 52 milhões de habitantes, recursos e acesso ao Mar Negro, é crucial para evitar que Moscou recupere seu domínio imperial, o que impactaria a Europa Central, transformando a Polônia em um pivô geopolítico vulnerável na fronteira oriental da Europa unida. Essa análise explica eventos como a Revolução de Cores de 2014 na Ucrânia, que afastou o governo pró-russo de Viktor Yanukovych, e o atual conflito na região, iniciado em 2022.


Da mesma forma, o Azerbaijão é destacado por seus recursos energéticos e posição estratégica na bacia do Mar Cáspio. Brzezinski o descreve como o "tampão da garrafa" que controla o acesso às riquezas energéticas da Ásia Central. Um Azerbaijão independente, conectado aos mercados ocidentais por oleodutos que evitam o território russo, é vital para reduzir a dependência europeia do gás da Rússia, objetivo que também explica a invasão do Afeganistão em 2001 e os conflitos na Síria, onde gasodutos alternativos, como o que conectaria o Catar à Europa, são estratégicos.


### Ameaças à Hegemonia Estadunidense


Brzezinski anteviu que a supremacia dos EUA enfrentaria desafios com o surgimento de novas potências e coalizões. Ele alertou para o "cenário potencialmente mais perigoso": uma aliança anti-hegemônica entre China, Rússia e, possivelmente, Irã, unida não por ideologia, mas por "agravos complementares". Essa coalizão, liderada pela China, com a Rússia como coadjuvante, seria comparável ao bloco sino-soviético do passado. Para evitar essa contingência, os EUA precisariam de habilidade estratégica nos perímetros ocidental e sul da Eurásia. Contudo, a atual aproximação entre China, Rússia e Irã sugere que essa previsão se concretizou, configurando o que Brzezinski descreveu como o maior risco à hegemonia estadunidense.


Essa perspectiva esclarece conflitos recentes, como a chamada "Guerra dos Doze Dias" no Oriente Médio. Embora justificada pelo programa nuclear iraniano, a ofensiva contra o Irã parece ter como objetivo central desestabilizar essa aliança e reduzir a influência de China e Rússia na região. O Irã, como pivô geopolítico, é crucial para a correlação de forças no Oriente Médio, e sua neutralização seria estratégica para os interesses ocidentais.


### A Rússia e a Expansão da OTAN


Brzezinski, um dos arquitetos da expansão da OTAN, reconhecia que a recuperação econômica e política da Rússia poderia reacender suas ambições imperiais. Ele questionava até que ponto os EUA deveriam apoiar economicamente a Rússia, o que a fortaleceria politicamente e militarmente, ou priorizar a consolidação da independência de estados como Ucrânia e Azerbaijão. A expansão da OTAN, que gerava inquietação em Moscou, foi um fator de tensão que Brzezinski já previa, apontando o dilema entre apoiar a democratização russa e conter seu potencial imperial.


### A Europa e o Risco de Realinhamento


Outro ponto relevante é a possibilidade de um realinhamento europeu. Brzezinski alertava para o risco, embora remoto, de uma colusão germano-russa ou uma entente franco-alemã que excluísse os EUA do continente. Antes do conflito na Ucrânia, a Europa estreitava laços com China e Rússia, com países como Itália, Grécia e Hungria participando do projeto da Nova Rota da Seda e a Alemanha se beneficiando do gás russo via Nord Stream 2. A adesão de nações europeias ao Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura, criado pela China em 2015, também indicava essa aproximação. As tensões com os EUA, intensificadas pelas ameaças de Trump de retirar o país da OTAN, refletiam o desconforto com essa reorientação europeia.


### Conclusão


*O Grande Tabuleiro Mundial* de Brzezinski oferece uma lente indispensável para compreender as dinâmicas geopolíticas atuais. Suas análises sobre o papel da Eurásia, os pivôs geopolíticos e as ameaças à hegemonia estadunidense anteciparam conflitos como os da Ucrânia e do Oriente Médio. Embora suas ideias possam gerar discordâncias, sua capacidade de projeção estratégica é inegável. Para analistas e entusiastas da geopolítica, a obra permanece uma referência obrigatória, revelando os interesses e tensões que moldam o cenário internacional contemporâneo.



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